segunda-feira, 24 de setembro de 2007

De precipício em precipício

Às vezes dá vontade de voltar ao útero da ignorância, do conforto, das sensações vazias sentidas pela metade (se é que isso já existiu um dia), ao mundo translacional ao meu umbigo. Quem sabe, nesse passado que insisto em embelezar, as contingências fossem apenas um pouco menos cruéis, e os mecanismos de defesa mais fortes em seu anonimato. Mas é claro que eu não poderia me contentar com isso, e desde muito cedo cedi ao ímpeto masoquista de sentir. De apertar com toda força os porcos espinhos, explicitando, analisando, dissecando meus mecanismos de defesa ao máximo, os pondo de lado ao mesmo tempo que cutuco aquele velho vício de sonhar. Claro que existem períodos em que essas coisas ficam mais desbotadas, e o aqui e agora ofuscante, bonito, feliz, raso e meu preenche minha vida.Um ano e nove meses foi um puta recorde. Que venham as pontadas. Afinal, não sou só eu em mim, e os outros têm espinhos bem afiados.

"Ficou difícil, tudo aquilo, nada disso
Sobrou meu velho vício de sonhar
Pular de precipício em precipício, ossos do oficio
Pagar pra ver o invisível e depois enxergar
Que é uma pena, mas você não vale a pena, não vale uma
fisgada dessa dor
Não cabe como rima de um poema, de tão pequeno
Mas vai e vem, e envenena, e me condena ao rancor
De repente cai o nível e eu me sinto uma imbecil
Repetindo, repetindo, repetindo como num disco riscado

O velho texto batido dos amantes mal amados, dos
amores mal vividos
E o terror de ser deixada
Cutucando, relembrando, reabrindo a mesma velha ferida

E é pra não ter recaída que não me deixo esquecer
Que é uma pena, mas você não vale a pena, não vale uma
fisgada dessa dor
Não cabe como rima de um poema, de tão pequeno
Mas vai e vem, e envenena, e me condena ao rancor
De repente cai o nível e eu me sinto uma imbecil
Repetindo, repetindo, repetindo como num disco riscado

O velho texto batido dos amantes mal amados, dos
amores mal vividos
E o terror de ser deixada
Cutucando, relembrando, reabrindo a mesma velha ferida

E é pra não ter recaída que não me deixo esquecer
Que é uma pena, mas você não vale a pena"


Maria Rita - Não vale a pena

(sim, textos diretos -e piores que o normal- também existem por aqui.)

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Rosas


E, novamente, lá estavam elas: desta vez perto da porta semi aberta do quartinho de lixo seco do prédio, num saco de supermercado. Teoricamente deveriam estar num contêiner de lixo orgânico lá no térreo, mas, novamente, lá estavam elas. Não, não fui eu quem as colocou ali, mas fui eu a recepcionada por elas. Não sei se isso é comum, mas achar rosas agonizantes por aí é algo que acontece com certa frequência em minhas andanças rotineiras. Às vezes uma única no asfalto, às vezes diversos buquês nas mais variadas lixeiras. É como se elas me perseguissem, me obrigando a lembrar que sim, ainda existe poesia no mundo. Ainda que em sacos plásticos, lixeiras, asfalto; Ainda que, sempre, morrendo.

domingo, 9 de setembro de 2007

Feriado

Nesse feriado, após uns dez anos, minha família se reuniu em viagem de novo. É esquisito o misto de sensações que isso passa: o estranhamento ao ver um irmão de barba fechada (e outro careca), a saudade compriida dos tempos de praia, fliperama, das intermináveis viagens de carro e tantas outras lembranças conjuntas. Não que minha família se odeie e não se fale há anos ou algo do tipo, nós apenas crescemos e as viagens passaram a ser algo impraticável nas nossas rotinas. Enquanto conversava com meus irmãos no silêncio da madrugada, um conforto quase surreal invadiu meus pulmões, e várias coisas que eu tinha esquecido vieram à tona, juntamente com algumas bruscas mudanças de prioridade. Fiquei perplexa ao perceber como acontecimentos de dois anos pra cá, que parecem tão eternos e gigantescos se tornam pequenos e efêmeros frente às vivências com quem simplesmente sempre esteve ali. Não que as mais recentes experiências, as novas -e maravilhosas- pessoas que conheci não tenham já marcado a ferro minha existência, mas a percepção disso(aquelas fichas de mil pontos que só caem com o tempo) surgirão apenas depois de algumas décadas. Não sei explicar direito a angústia, felicidade, conforto e vontade de sair correndo que permearam esse final de semana (a sensação é parecida com a que tive vendo O Poderoso Chefão pela primeira vez).

Estuprando uma frase famosa de alguém, eu digo que cada um sabe a dor e a delícia de ter a família que tem.